terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Eu agradeço seus defeitos

"Era uma vez, numa aldeia muito pequena, um homem que trabalhava como aguadeiro. Naquele tempo, a água não saía das torneiras. Era preciso pegá-las no fundo dos poços ou no fluxo dos rios. Se não houvesse poços perfurados perto da aldeia, quem não quisesse buscar água pessoalmente tinha que comprá-la de um dos aguadeiros que, com grandes tinas, iam e voltavam com o precioso liquido. 

Certa manhã, uma das tinas rachou e começou a vazar pelo caminho. Ao chegar à aldeia, os compradores lhe pagaram as 10 moedas de costume pela tina da direita, mas apenas cinco pela outra, que chegara praticamente pela metade.

Comprar uma nova tina era muito caro para o aguadeiro. Então ele decidiu que deveria apressar o passo para compensar a diferença de dinheiro que recebia.

Durante dois anos o homem continuou a ir e vir, levando água à aldeia e recebendo suas 15 moedas como pagamento por uma tina e meia de água. 

Certa noite foi acordado por um ruído em seu quarto:
- Psiu, psiu...
- Quem está ai? - perguntou o homem. 
- Sou eu - disse uma voz que saia da tina rachada.
- Por que está me acordando uma hora dessa?
- Quero lhe pedir perdão e se o chamasse em plena luz do dia duvido que me escutasse. Não foi minha culpa a rachadura por onde a água escorre, mas sei que o prejudiquei. Sei que deveria ter sido trocada por uma tina nova, mas no entanto você me mantem ao seu lado. Quero lhe agradecer e pedir que me desculpe. 

- É engraçado que você me peça desculpa - disse o aguadeiro. - Amanhã, bem cedo, sairemos juntos. Quero lhe mostrar uma coisa. 

O aguadeiro dormiu até o amanhecer. Quando o sol surgiu no horizonte, pegou a tina rachada e foi com ela até o rio. 

- Olhe - disse ao chegar, apontando para a cidade. - O que você vê?

- A cidade - disse a tina.

- E o que mais? - perguntou o homem.

- Não sei... o caminho - respondeu a tina.

- Exatamente. Olhe para as margens do caminho. O que você vê?

- Vejo terra seca e cascalho no lado direito e canteiros de flores no lado esquerdo - disse a tina, que não entendia o que o aguadeiro queria lhe mostrar. 

- Por muitos anos percorri este caminho triste e solitário carregando água até a aldeia e recebendo igual a mesma quantidade de moedas por ambas as tinas... mas um dia percebi que você tinha rachado e perdia água. Eu não podia trocá-la por uma tina nova e, por isso tomei uma decisão: comprei sementes de flores de todas as cores e as semeei em ambos os lados do caminho. A cada viagem, a água que você derramava regava o lado esquerdo do caminho, e nesses dois anos, você conseguiu criar essa diferença. 

O aguadeiro fez uma pausa e, acariciando sua tina, disse: - E você me pede desculpas? Que importam algumas moedas a menos se graças a você e sua rachadura o colorido das flores alegram meu caminho? Sou eu que devo agradecer seu defeito." - Amar de Olhos Abertos

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